Proposta de Millabur e Callupe enfatiza que demanda mapuche é de 385.860 hectares de vocação agrícola
Segundo o governador da Região do Biobío, Rodrigo Díaz, o “número não fecha” para ser uma proposta viável. A Comissão Presidencial para a Paz e o Entendimento tem prazo até 31 de janeiro:
Após a solicitação de uma prorrogação ao Executivo, os oito integrantes da Comissão Presidencial para a Paz e o Entendimento terão até 31 de janeiro para entregar ao Presidente da República, Gabriel Boric, um relatório final que proporá soluções para o histórico conflito indígena com o Estado.
Neste contexto, o ex-convencional constitucional e integrante da comissão, Adolfo Millabur, apresentou, junto com Gloria Callupe, uma proposta que alguns na comissão consideram um tanto “complexa”, principalmente porque alguns dos argumentos, segundo entendidos no assunto, assemelham-se a demandas do primeiro texto constitucional, rejeitado por ampla margem nas comunas com maior percentual de população indígena.
“Estão sendo discutidos todos os textos e analisados um por um”, afirmam fontes da instância que começou seu trabalho há mais de um ano, reunindo-se às quintas-feiras em La Moneda.
Restituição territorial
No segundo capítulo de um texto de 41 páginas, fala-se sobre “Terras e Territórios” e a forma como poderia ser realizada uma restituição de terras.
“A reparação deve ser ao Povo Mapuche, em função da perda histórica que sofreu de seu território. Assim, das 12.267.000 hectares que representam as 4 regiões, e portanto o território mapuche ou Ngulumapu, deve-se avaliar quanto dessa superfície é possível restituir, descontando disso as cidades, estradas e pequenas propriedades particulares”, diz o texto e acrescenta: “A atual demanda mapuche institucionalizada resume-se no seguinte quadro: 1.552 comunidades que representam 45.437 famílias das quatro regiões requerem 385.860 ha de vocação agrícola. Para evitar um aumento no custo dessa reparação, as medidas devem ser de curto e médio prazo”.
Especifica-se também que “sem prejuízo do mencionado, deve-se considerar que atualmente existem 4.315 comunidades, das quais sabemos que 1.552 institucionalizaram sua demanda. Consequentemente, há um universo de mais de 2.000 comunidades que representam uma demanda potencial por terras”.
Em outro trecho sobre o mesmo tema, propõe-se: “Será adjudicado um mínimo de 12 hectares agrícolas por família. No caso de terras florestais, deverá ser adjudicado um mínimo de 30 hectares por família”.
Questionado sobre a proposta de Millabur, o governador da região do Biobío, Rodrigo Díaz, afirma que o principal na discussão da comissão é que “deve prevalecer um critério de realismo para construir uma proposta viável. Há lugares que hoje são cidades e, claramente, se considerarmos a disponibilidade econômica e física do território, esse número não fecha de forma alguma”.
Da comissão, o ex-ministro Alfredo Moreno assegura que as propostas em discussão estão sendo estudadas com dedicação para entregar um relatório final viável. Nesse sentido, afirma que “o tema da restituição de terras é muito importante na discussão, mas naturalmente o Estado não dispõe de todas essas terras e é preciso buscar uma solução equilibrada que não crie problemas para outras pessoas”.
Instituições próprias
“Reconhecer por via jurídica as instituições próprias e as formas de organização tradicional mapuche” é outra das propostas incluídas no documento. Explica-se que “nessa linha, será garantido o direito à autogovernança mapuche em relação a suas instituições, práticas e autoridades ancestrais. Além disso, com base nisso, deve-se estabelecer a liberdade do Povo Mapuche para optar pelas alternativas de reparação, utilizando as formas de organização que considerar mais convenientes”.
O deputado pela Região de La Araucanía, Jorge Rathgeb, afirma que a ideia é “impraticável diante da normativa que nos rege hoje, porque qualquer pessoa poderia se autoidentificar como pertencente a um povo originário (dado o nível de miscigenação), pois é muito difícil distinguir quem é ou não mapuche. Esse problema já existe na Lei Indígena, e com essa ideia, aumentaria ainda mais”.
Indulto a pessoas condenadas no contexto de reivindicações territoriais
Outra das ideias contidas na proposta de Millabur e Callupe é que “todas as pessoas condenadas no contexto de reivindicações territoriais, e que não estejam envolvidas em crimes de sangue, que atentem contra a integridade das pessoas, ou que sejam crimes comuns, poderão receber um indulto particular por parte do Presidente ou do Congresso”.
Diante disso, o governador Díaz, do Biobío, argumenta que uma ideia desse tipo deve considerar todas as vítimas: “Qualquer proposta que se queira fazer deve englobar a totalidade das vítimas, ou seja, mapuches e não mapuches. Há outros crimes que não são de sangue, por exemplo, todos aqueles vinculados às drogas, e não são passíveis de indulto”, comenta o governador Díaz.
Fonte:El Mercurio