"Grande parte da lenha vendida em Puerto Montt tem origem no desmatamento ilegal da floresta nativa"
•René Reyes, pesquisador do Instituto Florestal (Infor), destacou que, do lado da oferta, ou seja, da madeira obtida das florestas, lembra que entre os anos 1989-2000 foram exportadas lascas nativas da capital regional.
"Grande parte da lenha vendida em Puerto Montt tem origem no desmatamento ilegal da floresta nativa", afirma René Reyes, pesquisador do Instituto Florestal (Infor), sede Valdivia, que participou do seminário "Oferta e Demanda de Lenha: Os desafios para a sustentabilidade energética na Região de Los Lagos", organizado por essa entidade e pela Secretaria Regional Ministerial (Seremi) da Agricultura, realizado em Puerto Montt.
Na ocasião, Reyes analisou a oferta e a demanda de biomassa e sua sustentabilidade na Região de Los Lagos, com ênfase na província de Llanquihue e em Puerto Montt como capital regional. Uma exploração que incluiu alguns elementos históricos.
Do lado da oferta, ou seja, da madeira obtida das florestas, ele lembra que entre os anos 1989-2000 foram exportadas lascas nativas da capital regional, período em "que foram extraídos das florestas 20 milhões de metros cúbicos (quase duas vezes o consumo anual de lenha de todo o Chile), o que significou uma enorme descapitalização e uma grande perda de floresta nativa que hoje representa uma ameaça ao abastecimento de lenha".
Ele acrescenta que, por esse motivo, "as florestas se deterioraram e houve muito desmatamento na província de Llanquihue, o que reduziu as possibilidades da floresta nativa de suprir o mercado de lenha em Puerto Montt".
Durante essa década, os envios de lascas nativas foram feitos de Angelmó para o Japão. "Foi um período de muita destruição de florestas em Los Muermos, Calbuco, Maullín, Fresia e Puerto Montt".
-Quais espécies foram extraídas?
-Estamos falando de coigüe, lumas, ulmos, de tudo o que existe na floresta nativa da região. Por outro lado, a demanda por lenha aumentou muito devido ao crescimento demográfico de Puerto Montt, consequência da expansão da aquicultura.
Então, por um lado, temos menos florestas ou menos madeira para abastecer esse mercado devido à superexploração e, ao mesmo tempo, um aumento na demanda por esse produto devido ao crescimento inorgânico e rápido dessa cidade nos últimos 15 a 20 anos, desde os anos 90, quando começou o boom da salmonicultura na região. Essa situação gera um desequilíbrio que resulta em muita madeira chegando da província de Osorno e até da Região de La Araucanía para suprir o mercado de lenha da capital regional.
-Esse cenário gerou um aumento da informalidade na venda desse produto?
-Grande parte da lenha vendida em Puerto Montt tem origem no desmatamento ilegal da floresta nativa. Inclusive, parte dela é roubada na Região de La Araucanía e em outras áreas do Chile, o que é complexo se considerarmos que alguns comerciantes dessa cidade se esforçaram para se certificar e melhorar seu desempenho como vendedores.
A existência desse mercado negro representa uma concorrência desleal para eles, pois chegam com um custo menor, já que a lenha tem origem informal.
SITUAÇÃO ATUAL
-Qual é a disponibilidade de florestas atualmente?
-Nas províncias de Llanquihue e Chiloé, estamos em uma situação muito crítica em relação à floresta nativa. Provavelmente, é a mais crítica em nível nacional no que diz respeito ao desmatamento, já que a expansão urbana e agrícola, além da chegada de muitas famílias da região central (durante a covid-19), estão causando desmatamento e degradação devido à superexploração de algumas espécies, como o tepú e o ulmo.
Agora, grande parte da responsabilidade por essa ameaça nessas províncias recai sobre os consumidores, que continuam optando por espécies que estão se tornando escassas na região. Portanto, é urgente criar uma política nacional que permita a recuperação da floresta nativa e diversificar a matriz energética para incluir o pellet ou outras fontes de energia.
Também é necessário melhorar a construção de moradias para que sejam mais eficientes e exijam menos aquecimento.
-A lei de biocombustíveis e o plano de descontaminação atmosférica (PDA) abordam essas questões?
-No plano de descontaminação atmosférica para a macrozona norte da região, deveria haver muito investimento público em recondicionamento térmico das moradias e na transição para o pellet, que é a alternativa que resta, já que o preço da eletricidade está subindo, deixando de ser uma opção viável para a maioria das famílias chilenas, assim como o gás liquefeito, que é caro, assim como a parafina.
Portanto, a única alternativa viável para aliviar a pressão sobre a floresta nativa é avançar em direção ao pellet e melhorar as moradias para reduzir a demanda por energia para aquecimento.
POLÍTICAS PÚBLICAS
-Você acha que esse plano faz uma transição adequada para novas fontes de aquecimento?
-O erro do PDA é propor a proibição da lenha. É preciso definir políticas públicas viáveis, e proibir que as pessoas de Puerto Montt usem esse combustível não é uma delas, porque, do ponto de vista socioeconômico, muitas famílias humildes ou de classe média não poderiam migrar para o pellet ou outras fontes de energia, precisando continuar a consumir lenha.
Assim, a polêmica surgiu devido a essa insistência, às vezes observada em certos setores públicos, de promover a proibição da lenha, o que não ocorreu apenas em Puerto Montt, mas também em Temuco e em outras regiões do Chile, mas sempre se conclui que é inviável, porque, do ponto de vista social, a maioria das famílias não pode pagar por outras fontes de aquecimento que não sejam a lenha. Mais do que proibir, é preciso incentivar.
Fonte: edição assinatura doEl Austral de Osorno